sexta-feira, 7 de setembro de 2012

Racismo, classismo e misoginia na luta contra o Funk


            Fico impressionado com as declarações de ódio ao Funk e a seus apreciadores que leio internet afora. É corriqueiro no meu mural do Facebook críticas muito severas, carregadas de racismo, classismo e misoginia. Não sou especialista para falar sobre as origens do ritmo e sua evolução (nem é meu foco). Mas sabemos que ao chegar ao Brasil, o funk se popularizou entre as camadas populares das periferias das grandes cidades brasileiras. O funk, que aqui tomou ares brasileiros, das favelas do Rio de Janeiro, se consagrou como o pancadão carioca.
            Os insultos ao ritmo ou aos que o curtem são de diversas procedências. O que mais leio é sobre a “terrível” promiscuidade das letras. Pois bem, é fato que o pancadão carioca, na maioria dos casos, tanto nas letras, quanto na melodia e dança é banhado de sensualidade. Isso aos olhos da classe média brasileira, guardiã da moral e dos bons costumes, é uma mazela do povo brasileiro, da qual morrem de medo que seja revelada mundo afora. Só acho gozado que muitos desses críticos são aqueles que louvam a sociedade holandesa e a toma por vanguarda por permitir alguns tipos de atos sexuais em locais públicos e a expor prostitutas em vitrines em plena Amsterdam. São os mesmos que se embebedam da sensualidade e promiscuidade do Pop estadunidense nas pistas de dança. Muitos deles são pessoas que lutam pela liberdade sexual. Não estou me posicionando contra a decisão do governo holandês, o Pop ou a luta pela quebra dos tabus que giram em torno da sexualidade, pelo contrário. Eu só não entendo o motivo de quem detém o capital (ou melhor, detém ideologias e um certo status quo, já que o capital é da burguesia e não da classe média) poder expressar sua liberdade corporal enquanto a preta da favela não tem direito de ir ao seu baile sem calcinha sem ser crucificada!
            Outra polêmica é a associação do ouvinte do pancadão carioca ao usuário de drogas. Acho que nem preciso dizer o que a gente vê (ou melhor, sente o cheiro) pelos corredores de qualquer universidade desse país. Que estudante nunca presenciou o uso de drogas ilícitas em uma das diversas festas universitárias que pipocam por aí? Mas o favelado, não! Esse não pode fumar sua maconha em paz, “esses maconheiros têm que ir pra cadeia”! Ah! Mas lá na Holanda...
            Amigos, será possível que vocês não enxergam que suas críticas estão muito mais fundadas no racismo, no machismo e na diferença de classes sociais do que no simples ritmo musical? E se essa mesma corrente do funk, ao invés de ser popular nas periferias o fosse entre a elite europeia, suas críticas ainda existiriam? Ou seria “o ritmo da liberdade de se cantar sobre os desejos sexuais”? (Eu sei que não se fala só sobre isso nas músicas mas me atenho a essa característica por ser o principal alvo das críticas).
            Eu sei que os funkeiros de ônibus e as festas do vizinho regadas a pancadão em plena terça-feira às 23 horas são insuportáveis, mas isso não é algo condicionado pelo funk. Já vi passageiros de ônibus em Belo Horizonte ouvindo outros ritmos sem o uso dos fones de ouvido. E as repúblicas do interior? Quem nunca ouviu casos de vizinhos incomodados com as festas de moradores de repúblicas em Ouro Preto, São João del Rei, Itabira... Eu mesmo tenho um amigo que se sente injustiçado pois, segundo ele, "os vizinhos têm que entender que é um momento que faz parte da vida de um estudante universitário". Detalhe: ele também é um "Fora Funk!" (acabei de inventar essa expressão rs).
            Pior ainda é ouvir que "funk não é cultura". Pra essas eu apenas indico o dicionário mais próximo.
            Enfim, aos funkeiros, fica meu apreço às expressões culturais e a tudo que faz bem para si sem inibir o espaço do outro. Se é o que te faz feliz e não oprime o direito de outras pessoas, não vejo problema algum em descer até o chão ao som do pancadão.


(Este texto foi adaptado e melhorado por sugestões e críticas, obrigado a todos pelos toques).

5 comentários:

  1. Pra acompanhar na Geografia da Depressão. XD

    http://www.facebook.com/photo.php?fbid=399770480078631&set=a.252923564763324.67641.252902311432116&type=1

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  2. Delícia seu texto. Gosto mais quando você escreve nesse estilo de protesto e crítica, investe mais nele!

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  3. Achei o texto incrível também. Não gosto de funk, mas admito que já ouvi alguma coisa quando era mais nova. Não tenho orgulho disso, pois não gosto do som/música, entretanto acredito que todos PODEM e DEVEM ouvir o que bem entenderem.

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    1. O importante é sempre respeitar o que xs outrxs gostam. Ainda que nós não gostemos.

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